sexta-feira, novembro 28, 2014

AUTOMÁTICO!

Uma hora acostuma-se a tomar banho quente no verão
uma hora acostuma-se a andar de pés descalços no chão sujo de casa
uma hora acostuma-se a ter resto de comida na barba,
acostuma-se a a ter pilhas de papel
acostuma-se a desenhar gente nua
acostuma-se a ter mesma quantidade de coisa
acostuma-se a esses tempos em que tudo tem prazo pra acabar e
os "até depois" são "até nunca mais".

terça-feira, novembro 25, 2014

A PAIXÃO FINITA!










Comprei o terno e o sapato pretos, a camisa branca, a gravata amarela e as abotoaduras douradas. Mas não casei. Não porque a paixão - que dizem ter prazo - acabou, e o amor não foi suficiente para preencher o rombo que existe desde que se nasce e que a paixão cronicamente expansiva enlarguece pra poder caber. Não. Com as mãos seguras e um silêncio energicamente confortável, ainda sentia diariamente como se fosse a primeira vez as mesmas pontadas de emoção e o ar quente que partia do coração, e circulava e bombeava o corpo, deixando a respiração arfante à beira dos pulmões explodirem. Isso era uma alegria profundamente verdadeira, o que poucas vezes aconteceu em mim. Isso foi o que procurei a vida inteira.  

Também não casei não foi por causa do medo de aventuras - tudo o que acontece nos intervalos da vida -, o que acomete a maioria dos indivíduos hoje em dia, não só aqui no Rio de Janeiro. Paixão é uma aventura. Amor é uma aventura. Duas pessoas juntas são uma aventura. E nenhuma delas depende do tempo para ser intensa, porque todas são naturalmente intensas e violentas desde a primeira unidade incontável de tempo que começam. Não existem aos poucos. Eu nunca tive medo das aventuras que acontecem nos instantes, na verdade, sempre tive um devoto apego a elas, principalmente ao amor e à paixão, porque todas me fizeram sentir especial, ter momentos especiais.

E por que não casei? A verdade é que não escrevia há mais de um ano, e escrever é uma aventura que me deixa vivo sem precisar ter consciência disso.

sábado, novembro 15, 2014

EXPECTATIVA!

Meu cachorro morreu. Não tenho notícias de minha mãe há um mês. Meus sonhos ficam cada vez mais desérticos e a rotina não me deixa mais escrever, o que me obriga a ficar lembrando as coisas de cabeça, fato que nunca consegui fazer muito bem, porque os instantes são carregados demais, principalmente pra mim, que me atrapalho com a facilidade de um jovem adulto com o comportamento que não condiz com sua idade, já que paira sempre um medo de não saber ser-se, medo das múltiplas paixões, saudades e carências reprimidas. A verdade é que quando se passa tanto tempo amando devotamente tudo isso, uma hora acostuma-se à inerência dos impropérios e indecisões, e termina-se por viver uma vida sem a expectativa que um dia pareceu indissociável do corpo e que tinha como grande culpada o ser humano, sem qualquer exceção. Aliás, o que dizem sobre o ser humano ser naturalmente comunicativo é uma grande mentira. Não passa de conveniência para os tontos. Ninguém quer esperar pelo outro. Ninguém quer esperar pela resposta do outro. Uma fração de milésimo ou cinco anos têm a mesma sensação de agonia, até que se percebe que o silêncio é tudo. A verdade mesmo é que estamos sozinhos, somos sozinhos e seremos sempre sozinhos, fato que pode levar uma vida inteira pra ser entendido - normalmente através de uma epifania precedida de uma decepção - ou que nunca é aprendido. Mas quando se aprende enche-se o corpo de uma coragem que deixa o timo prestes a explodir e cheio de uma inconsequência violentamente sensual que acelera o coração e vai crescendo, crescendo, crescendo, até que se queira desbravar o mundo e sem saber onde vai dar. Viver sem expectativa é perigoso, porque fica-se sedento pelo nada. E como culpar alguém por querer o nada?