terça-feira, novembro 24, 2015

MITO!

Fausto tinha o ímpeto 
da loucura desmedida;
Eu definho na covardia 
da normalidade.

TARRAFA!

Bota esse gole escancarado de vida de uma vez em minha boca: vivo sempre pronto - em rede armada no quintal - para o que tua cabeça esgueirada em mim e testa suada dizem ao meu sossego. Lhe darei mais que qualquer arrepio fuleiro em procissão de Bom Jesus dos Navegantes e me preencherás com qualquer matéria mais dura e forte que chuva no dia 19 de março. Vai, sai, sobe aqui, que a existência vai se evolar em antologia. Tum!

domingo, novembro 15, 2015

LAS VEGAS!

Se for para ficar sem hábitos de uma vez,
primeiro desnudemos a vida 
e desentupamos o coração;
o incêndio vem depois.

terça-feira, novembro 10, 2015

O MUNDO EM CANINDÉ DE SÃO FRANCISCO!

Pisada forte em terra batida, zoada do reboliço da areia que se levanta, que faz fumaça e se aquieta em outro canto para gentilmente ceder lugar ao rastro onde passo. Em frente é só a vida que sonho ter, e é por isso que vim aqui, trazendo meu coração brega e desatinado, quase um terremoto no sertão de Canindé. Um vento bateu, veio uma zabumba de dentro: com os olhos amargados pelo suor, lhe vejo de longe na porta de casa, num canto da escada de quatro degraus, catando um pedaço de sombra às três da tarde e chupando uma manga espada para o tempo passar, enquanto olha os pingos do leite amarelo furando o chão. Nessa hora, penso em todas as vezes que voltei mas não tive coragem de seguir até o fim da estrada, e fui embora, matando nossas tardes de chamego sob o olhar de São José seguidas de café com macaxeira. Agora, vendo teus olhos esperançosos se dirigindo a mim, olho para trás uma última vez, vendo todo aquele mundo percorrido, e finalmente percebo que o único lugar em que existe vida é aqui, nesse sol, nessa cama, nisso que é seco e macio e depois escorre doido como o São Francisco.

segunda-feira, novembro 09, 2015

ARTE SUJA!















Aquela arte suja deixei no bar junto às barbas ensopadas de suor. De sujo já tenho eu, com o ópio, o cheiro de coito, os olhos espaciais, a Teoria das Vidas Selvagens, o tesão espasmódico, a mente arregaçada, puteador. Eu também sou uma arte suficientemente suja, livre de ismos, que não pertence a ninguém, que ninguém sabe quem fez, de onde veio, pra onde vai, qual efeito tem, e que existe somente para ser atravessada por olhares passageiros de gente que tem a vida em queda. Sou - porque não tenho estados transitórios de espírito - uma arte metalinguística, com infinitos códigos e auras de mim mesmo dentro de mim mesmo, que, dependendo de quem olhe, pode fazer cada eu ou vários eus se ouriçarem e emergirem (simultaneamente). De tão sujo, vou rolando por aí com a frase estampada no corpo "Passe a língua aqui". 

A TEORIA DAS VIDAS SELVAGENS!

É quando chego nesse meio-escuro que sinto meu corpo nu e minha liberdade vindo, morrendo, crescendo, indo, diminuindo, revivendo, chacoalhando paixões, pelos, trepadas no sol quente, viagens longas, horas de solidão, mitos que finjo que não existem e o amor. Eu sendo apenas eu e me revirando em mim. Quanta revolução eu já fiz, que não lembro mais das coisas em estado original, acredita? Isso, na verdade, não tem problema nenhum, porque coisas em estado original não existem, pois precisariam nunca terem sido pensadas, sentidas ou pronunciadas. Esse meio-escuro é meu e não cabe em lugar nenhum. Meu peito tatuado sabe.

domingo, novembro 08, 2015

SENTIMENTALISMO!

Agora que estou defronte a ti,
não tenho nada a dizer-te;
Apenas morrerei vagarosamente
diante de teus olhos falaciosos.

terça-feira, outubro 27, 2015

ROY LICHTENSTEIN

Essa distorção reticular que aparece no que faço é a forma que tenho para mostrar como me sinto diante da sociedade que vivo e tentar amenizar a quantidade de estímulos que recebo em cada página de revista ou em cada vitrine da 5ª Avenida. Estamos beirando os anos 70 e não duvidaria que daqui a trinta ou quarenta anos a sociedade esteja muito parecida com essa mistura de catatonia e frenesi que estamos vivendo hoje, se não igual. Se eu pudesse fazer um pedido? Seria que as pessoas olhassem as coisas mais de perto e com mais cuidado, incluindo a arte e o todos os seres, porque só assim é possível enxergar sua alma e seu coração. 

(Guilherme sobre os 92 anos de Roy Lichtenstein)

DISTOPIA!

No momento em que evocas meu nome,
meu repouso espraia-se
e minha vida é escravizada
numa viagem eternamente noturna
e sem volta.

Eu fico aqui, nulo,
aos escombros granulares,
sendo rejuntado por teus gozos e gemidos,
até que esteja pronto
para que outra vez possas me destruir.

GANGRENA!

Senti tuas mãos cuidadosamente desenhadas deslizarem
e o ranger do peso de tuas pernas sobre minha fortaleza,
aproximando-se, indômito,
desbravando meus vazios
sem rastro de hesitação.

E eu, inerme, entreguei coração e alma desnudos,
diante de teus olhos lânguidos e tua boca suave dizendo-me:
“Estes sonhos que trago
fiz para serem só teus
e vos darei todos os dias”.

Tu me tomaste, e quando o fizeste,
chorei de paixão, chorei por fora e por dentro,
que não senti a lágrima escorrer
nem a emoção no tórax ricochetear
de excitação.

Já pertencia a ti
nos primeiríssimos dezoito instantes
que apareceste,
mas não senti que teu único prazer
era minha desgraça.

sexta-feira, outubro 09, 2015

A VIDA DIANTE DE UM REMBRANDT!













Algumas coisas se parecem com o ato de observar um quadro de Rembrandt:

Você sabe o que vai encontrar no instante em que avista, não importa a que distância, da tela do computador ou da entrada do salão do Rijksmuseum. Mas ainda assim você quer olhar bem de perto, com a desculpa de que é só uma bisbilhotada rápida e inofensiva para saber o que tem de tão especial. Até que você decide ir mais perto e, quanto mais se aproxima e é seduzido, sente a adrenalina do atrevimento incendiando o corpo e alimentando o prazer intrépido que parece infindo e lhe come por todos os lados até a gloriosa perdição. Mas logo é possível perceber que intrínseco ao deleite da catarse vem o risco de trazer direto para a sua vida o horror disfarçado de sensibilidade e quietude. É necessidade, fraqueza ou provação?

terça-feira, outubro 06, 2015

LE CORBUSIER!




- Não é muito normal me perguntarem de onde vem minha inspiração. Mas isso é bom, porque parece que as pessoas conseguem saber assim que olham ou entram em contato com cada volume de concreto de pé e sentem de onde vem. Mas vou contar-lhe um segredo: Sou um pouco médium-sensitivo e capto as necessidades dos espíritos das glebas onde vou  construir e dos vivos, concateno tudo e faço. 


Guilherme (sobre os 128 anos de Le Corbusier). 

EFEITO RAUMPLAN!

Bando!
disseram, vociferaram, enfiaram no meu GnRH:
"tens 20m², coisa-nenhuma".

Eu insistia em ser maior,
querendo caber mais.
"pobre criatura,
expansivo por natureza".

Livrei-me do peso,
dos adornos, firulas, retorcimentos,
passado, policromia deturpada:
demolição.

Eis-me em osso puro:
pilar, viga, plano,
racionalismo, luminosidade.

Acabou, trouxas,
sou bem maior exatamente como pensava.

segunda-feira, setembro 28, 2015

PROJETO 7!

Prazer.

Meu nome não importa. Desejo apenas ser uma pessoa e espero que compreenda (sinta). Lhe convidei para a exposição da Carla Chaim para tentar explicar como eu sou. Não pense que essa é a primeira vez que o faço, tampouco que é a primeira vez que penso em fazê-lo. Na verdade repito mentalmente essa explicação  todos os dias, às vezes numa frequência de quatro vezes ininterruptas, criando um ciclo, o qual sempre me dediquei com o afinco de um homem que ama-cultiva-ama suas próprias convicções. Isso quando não erro uma palavra, pois se erro, repito outras quatro vezes porque é meu número da sorte.

Cá estamos. Vê? Este chão de concreto queimado salpicado de tinta branca, essas paredes de compensado rabiscadas de crayon preto, o cubo metálico que penetramos vagarosamente como um animal num novo habitat e esse som de batimento de cardíaco se parecem muito comigo. São a exacerbação de alguma coisa, alguma coisa que precisou sair. 

O fato é que sou oco por natureza, assim como as coisas que um dia já tiveram seu estado bruto e foram violentamente sendo transformadas em alguma outra coisa. Sou vazio e vão me enchendo de coisa e enchendo e enchendo sem qualquer discernimento até eu fique prestes a explodir. Aí, assim como uma dama da noite ou a maré ou a morte, preciso sair do mundo para me esvaziar e começar tudo de novo. É um processo natural. Agora estou me escancarando aos poucos, mas sempre tenho medo de voltar, porque sei que não faço parte daqui. Se o mundo não comeu seu coração, há de enxergar (sentir).

quinta-feira, setembro 24, 2015

NA COMPANHIA DE ROTHKO!

Não veem que eu morri?
Eu morri, não importa como foi, é um história,
história toma tempo, e tempo tem ficado escasso
nessa realidade dominada pelo excesso de lixo.
Vão viver e celebrar o Sputnik, a fibra ótica,
as drugstores, os letreiros kitsch.
Deixem-me ir.
Ou pelo menos finjam que morri e criem um motivo.
A porra que for, mas me deixem ir.

Achei meu lugar.

Chiaroscuro,
pé direito colossal
com perturbações quase nulas e uníssonas,
ninguém me vê,
eu vejo e me deito
nesta madeira que pode parecer fria, dura e desconfortável,
mas não é,
é o que eu sempre quis.
É maravilhoso e mágico.

Não precisam oferecer complacência, misericórdia, luto,
deixem para as carnes frescas e momentaneamente róseas.
O mundo já me matou, meus ciclos se encerraram.
Deixem-me sumir, sem réplicas ou tréplicas espirituais,
nem lembranças deletérias.
Estou no lugar que devo estar,
Somos só Rothko e eu.

terça-feira, setembro 22, 2015

O ERRO DE BERNINI!

Fruto de amor incompreendido
e perfeição irrequieta,
repouso em águas sagradas
diante do espetáculo terreno.

Sinto-me completo,
insaciavelmente forte e imponente,
principalmente quando chegam,
e me encontram absorto e amoral
contemplando o nada.

Olha-me o quanto quiser
e volta sempre que o tédio violentar,
quem sabe assim não descobres
e abrandas minha única tristeza:

não posso contemplar-me.

CASTELO DE SANT'ANGELO!

Quando acordares,
continuarei aqui,
sendo a ilusão gozosa
que vaga em teu espirituoso leito
e preenche todos os teus atos
previsíveis e enfadonhos.

Quando pensares que morri,
estarei cuidando de tua vida
imersa em mágoas palpitantes
e esperanças dementes.
No fim, terás somente a mim:
Tua única verdade.

domingo, setembro 20, 2015

RIBEIRA!

Chegou a maré das quatro,
tudo encheu,
e nem sei teu nome.

Já me embolei no sargaço,
caí no indizível,
e agora não sou mais leme.

sexta-feira, setembro 18, 2015

ATACAMA!

Eu apenas existo e sou simples, muito simples, muito mais simples que um microrganismo que não tem intenção de promover revolução nenhuma, e gostaria de permanecer assim até o fim dos meus dias: sem impropérios e permanências duradouras demais. É que a existência já é tão torpe, que não quero correr o risco de ter a lentidão da morte agravada. Não tenho, não sou e não quero ter nada, mas tenho essa mania sistematicamente involuntária e irritante de atrair o mundo mesmo sendo um ser primário e insignificante, o que não entendo, como muitas das outras coisas que também não entendo, como as necessidades humanas e o satélite. Eu bem sei como as chegadas também são perigosas, principalmente para mim que nasci para ser sozinho. E muita coisa que chegou, trouxe uma enxurrada e me arrastou, me obrigando a trocar de lugar incontáveis vezes. Por isso, gostaria apenas de ir vivendo sem adesões. Não chegue mais perto, posso não aguentar outra mudança.

quarta-feira, setembro 16, 2015

TRIÂNGULO DAS BERMUDAS!

Triste de quem precisa de um tempo,
que vai se retirar para tentar sobreviver
e esquece que não se pode viver
uma coisa de cada vez.

Tempo: a realidade já é volátil e catabólica o suficiente.

Tempo, a realidade já é volátil e catabólica o suficiente.

RECIFE ANTIGO!

A extensão do meu coração,
na verdade, é muito curta,
sem cor, sem calor, sem emoção,
puramente cartesiana e
uniforme, suficientemente uniforme
para alguém que só precisa existir.

Estou em algum lugar,
entre vidro e cantaria,
trêmulo expansivo,
rogando às escuras
e batendo palma:
liberta-me,
sonho em ser teatral.

Vou longe.

terça-feira, setembro 15, 2015

SIBÉRIA!

Sentei no chão e decidi espalhar a pilha de papel com tudo que já escrevi, inclusive o que rasguei na noite passada e resgatei do lixo assim que acordei. Aí me dei conta que me encontro num daqueles muitos momentos em que não sei o que fazer da minha vida, por isso vou me alimentado do que já passou. E por mais que me esforce para criar algum tipo de vontade de perseguir um futuro, eu não consigo. Hoje a caça sou eu.

segunda-feira, setembro 14, 2015

PASSEIO!

Não te ajoelhes,
porque não nasci para ser destino de ninguém. 
Me encontraste diante do Jardim das Delícias;
agora estou de partida para O Juízo Final.

domingo, setembro 13, 2015

VENTANIA!

Ah, amor,
Ainda lembro daquele domingo vibrante,
Que me viste livre e regozijante
Entre as infinitas figueiras da família Ardor.

Ainda sinto o rastro de tristeza,
Quando tive coragem e
Olhei-te fundo nos olhos
No momento em que, despudoradamente,
Me ofereceste a fruta.

Ainda lembro como enchi a boca e disse-lhe:
“Temo comer, porque, de tão linda, se parece com o nosso eterno amor.”;
Prontamente me disseste:
“Come, pois nada dura para sempre”.

quinta-feira, setembro 10, 2015

SEM TÍTULO

Disseste que em uma semana voltarias 
para ouvirmos o lado B da fita do Morrissey. 
Ainda espero 
e espero que não esqueças de tuas promessas.
Now, everyday is like Sunday.

ORIGEM!

Essa coisa de ter que conviver com o que chamam de alma é uma coisa séria. Parece um terror fadado e tão forte que, às vezes, sinto ser exclusivamente meu, fazendo com que eu me encha de uma responsabilidade arfantemente crônica. Aí,quanto mais penso, me destruo, porque é uma condição expansiva que me obriga a sofrer por amores perdidos que esfacelam meu timo. Agora, encontro-me refestelado sobre uma relva úmida dentro de uma realidade sem qualquer horizonte em que imagino como os nativos de Marte nos temeriam porque nós somos os verdadeiros E.T.s. Estranhos.

quarta-feira, setembro 09, 2015

JUEGO!

Minhas palavras estão acabando, amor, 
e tu não me lês. 
Não sei se me arrisco e vomito o que sobra 
ou se guardo e me afogo de uma vez.

(Re)UNION!

Desde que chegaste e bateste em minha porta segurando teu gato, sou muito mais fora da medida. Sabia que ficaria não somente para um chá, mas também não sabia que ficaria tempo suficiente para tomar conta da casa. Logo eu que penso tanto - e chego a pensar que vou morrer de pensar -, não consegui prever nada do que viria me acontecer. Senta-te, temos inferno à vontade.

domingo, setembro 06, 2015

LIBERDADE!

Tem um momento da vida que se anseia tanto por liberdade e se tem uma consciência disso, que praticamente todo o tempo útil se transforma em tentativa de tornar isso possível e pleno. Mas uma liberdade que não tem nada a ver com emancipação. Na verdade, tem. Uma emancipação de si mesmo e de tudo que prende e impede de se realizar coisas que se deseja e que são básicas para sobreviver. Emancipação do medo, da solidão, da covardia. Pelo menos emancipação, já que livramento é impossível. São coisas indesgarráveis. Mas liberdade é uma perigosa porque é oriunda do caos. É preciso por sua própria conta em risco, porque há-se a chance de não conseguir parar e querer que a liberdade vá aumentando descontroladamente  e, assim, torne-se sistemática. Você me entende? Já sentiu a liberdade se expandindo? A liberdade é assim: se sobrepõe a tudo.

sábado, setembro 05, 2015

BACTÉRIAS!



















Um dias desses eu vomitei. Vomitei na rua, no caminho de casa e fui acudido por senhor que colocou a mão sobre meu ombro e disse "vai ficar tudo bem". Senti como se Augusto dos Anjos tivesse me tocado e todo meu corpo, inconscientemente, foi aos poucos ficando livre de coisas desnecessárias. As coisas desnecessárias são como bactérias: algumas são realmente mortais e precisam sair o mais rápido possível; outras precisam ficar por mais um pouco de tempo, porque vão eliminando ooooutras desnecessidades que não podem ou não conseguem ser eliminadas naturalmente. Uma desnecessidade vai sobrepondo a outra e outra que se sobrepõe a outra e outra que é sobreposta e assim vai. É um homicídio atrás do outro. O vômito é isso: são os restos ou um todo de uma vez saindo. Mas o gosto do vômito é amargo. Uma hora sai tudo e, então, chega mais um vazio, mais uma oportunidade de vazio, para quem sabe começar tudo de novo. 

sexta-feira, setembro 04, 2015

Em formação!


Caminhei não sei por quanto tempo e vi e senti e ouvi tanta coisa, mas não vale a pena contar, não porque não ache necessário, mas porque tenho tantas outras coisas para falar e que precisam ser faladas - porque já me matam de ansiedade -, que seriam mais instantes gastos com o passado. Fala-se muito em "não se sabe do dia seguinte", mas na verdade ningém nunca sabe do minuto, do segundo, do milésimo ou do instante seguinte. Então, não quero e não consigo me demorar porque clamo falar. Falar com com o corpo, com a alma e com o coração. O caminho e o tempo não importam, só queria dizer que:

Apenas segui o rastro de amor que é somente teu e cheguei para lhe dizer: quero ser teu. Faz-me ser de ti e me envolve com o mais puro amor que sai de todos os teus poros e teu espírito e me invadem bruscamente por baixo, por dentro, pela boca, fazendo minha vida cair de joelhos pela força que chega.

Sou eu bem aqui.

quarta-feira, setembro 02, 2015

33!

Cheguei no hospital. O paciente era eu. 

Trinta e três minutos desde que comecei a esperar aqui.


O tempo foi passando e ficando mais difícil até que chegou o momento em que precisei fechar o olho e me entregar ao que me puxava, talvez sabendo que seria a única forma de por um instante não ter a cabeça metralhada por esse monte de pensamento autoimune que me enche o saco há séculos.
Naquele momento, todos os meus regozijos e síndromes se misturaram, ora parecendo uma erosão violenta que sai arrastando o que encontra e se revira na própria inconsciência, ora parecendo uma pistola disparada em que o fogo se espalha e, mesmo sabendo que não vai dar em nada, se entrega.
Só tem trinta e três minutos mesmo que estou aqui?
É que apresento um cansaço descomunal. Trinta e três já é um número grande por natureza e só de pensar já fico mais cansado e ofegante. É justamente esse tempo (gigante) que me assusta, sabe. Aliás, o tempo assusta e é violento, mesmo pra mim que nunca tive medo de nada. O tempo assusta e é violento princialmente para quem o percebe demais, para quem consegue acompanhá-lo. Me falaram que o tempo tem que ser esquecido, mas como é que se esquece do tempo?
Tudo que havia para ser revirado dentro de mim, foi revirado. E sempre que me reviro ou sou revirado, as coisas não acabam ou se acalmam, tampouco demoram 365 dias ou 4 minutos pra acontecer outra vez. Tudo volta a acontecer em frações mínimas de tempo depois. Agora, provavelmente, já pode estar começando a borbulhar outro estouro e vindo num vulto ascendente, me comendo de baixo pra cima. Quero dizer que as coisas de qualquer natureza precisam cessar um pouco para mim.
Com a cabeça praticamente toda entregue, penso que não sei se consigo justificar minha vida e dar rédeas a ela. Talvez seja por isso que não consiga construir nada e ter minha própria história. Às vezes é que tão difícil que fico em dúvida e não sei se leio o Manifesto Surrealista ou a Bíblia. Gosto de fazer desafios comigo mesmo. Minha única intenção é destruir a mim mesmo.
Neste momento, tenho uma vontade de sair por aí pelo mundo e praticar o que os nativos de língua inglesa descrevem com o bonito nome de wanderlust. Sabe, venho percebendo como alguns conseguem naturalmente realizar acontecimentos de forma mais simples, enquanto outros precisam de um tempo mais extensivo para fazê-lo, não porque não tentam ou não sabem, mas porque a naturalidade de ser deste segundo tipo de pessoa é mais lenta. Se pudesse dizer alguma coisa agora, eu diria: tenha paciência com elas.
Eu estou aqui parado, com a wanderlust me batendo e a coragem indo no ritmo de uma força humana. Este foi o pensamento que venceu a batalha com todos os outros. É que meus pensamentos acontecem assim, deixa eu explicar: há uma torrente deles, como um fluxo de porra cheio de espermatozoide. Só um vence e é ele que fode com tudo. E o mundo é isso mesmo, essa coisa embolada, distópica, doentia e seletivamente natural.  
Parei de tomar meus remédios pro corpo. Deve ser por isso que vim parar aqui.

sábado, agosto 29, 2015

INÍCIO!

Minha mãe disse “não solte minha mão”, mas sempre fui teimoso. E por isso, hoje faz três dias que vim parar nesse mundo diferente chamado “       “ e sou obrigado a conviver com seus moradores carinhosamente conhecidos como “coisa". Aqui ninguém me vê ou me ouve. Mas também não quero contar com ninguém,  ao mesmo tempo que tenho uma essência naturalmente carente. É, estou completamente sozinho e sem nada verdadeiro, a não ser pela companhia de um líquido que posso desfrutar dez segundos por dia ou a telepatia com qualquer animal durante 10 minutos. Mas nunca é possível é ter os dois no mesmo dia. Difícil.

sexta-feira, agosto 14, 2015

VOLTA!

Comecei a voltar a escrever em papel margeado pelo qual sempre tive uma paixão incomparável e deleitante e incorruptível desde que (...), desde que descobri que vivo dependente da complacência da alma e me tornei entusiasta da metafísica. Mas fiquei tão impregnado de mim mesmo que precisei me desgarrar e resolvi me aventurar na modernidade proporcionada pela máquina de datilografar, o que me aconteceu no momento em que estava por encerrar mais um ciclo da minha vida e que ansiava avidamente a descoberta de alguma coisa nova, mesmo sabendo que até que se internalize a ideia do novo vai-se até o limbo para ver se se suporta a ansiedade. 

Precisava sentir o prazer como o de quem morde uma manga e tem todo o caldo amarelo escorrendo pelo pescoço e fazendo cada pelo se ouriçar abruptamente; e poucas coisas guardam esse prazer. É preciso coragem para procurar. Então a máquina era isso. O que mais me faz é aquele barulho que é uma espécie de frenesi avisando "olha, você está vivo (neste mundo infernal) por mais que não queira". Era o que me fazia ficar ali todos os dias, impreterivelmente às quatro da tarde, porque o som de cada tecla era o anúncio de mim mesmo, o eu que saia aos poucos com a força bruta de todos os movimentos mesclados ao terror e à hesitação da rotina turbulenta, ansiosa, arfante, vacilante. Era o prazer da liberdade violenta por instantes. Uma liberdade mesclada a uma libertinagem adolescente que pouco apareceu na época que morei no Recife. 

Diferente da máquina, o papel já é um extensão de mim, naturalmente. Então trocávamos de lugar constantemente, o que me permitia viver com mais delicadeza, às vezes me deixar e ser alguém com mais liberdade por mais tempo, liberdade digna, plena, e não desperdiçada. De um jeito que se esquece que você é alguém e simplesmente vive. Quando não me suporto mais é o papel que se torna quem ou o que preciso ser. E não preciso ter medo das consequências - que não são poucas - de toda a exacerbação da liberdade que sonho. É minha própria vida entrando e saindo através do meu próprio corpo.

Guardei isto durante cinco meses, mas só tive coragem de contar agora, porque algumas coisas precisam de um brio grande demais para serem expostas. 

sexta-feira, agosto 07, 2015

CASULO!

Tem uma certa música que tenho ouvido muito ultimamente e gostaria que fosse a música de meu funeral, enquanto as pessoas choram e olham-me como nunca me olharam em toda essa vida. Mas não há ninguém a quem possa confiar esse desejo, porque vivo sozinho desde que a capital mudou de lugar e agora é em Aracaju. Aliás, também não tem ninguém pra chorar por mim debruçado no caixão. Nem sei se vão me achar, por isso preciso pensar numa morte que seja pública, do contrário, Deus vai demorar tanto pra me consumir que acho que não vale o esforço. Gostaria de alguém que me atendesse esse último desejo como um último sentimento e único de que um sonho humano se realizou. Não consegui escrever minha própria história. Não consegui me conectar a nada, nem a ninguém.

domingo, agosto 02, 2015

PULSAÇÃO!
















Sabe, hoje eu acordei e senti vontade de tomar meu café em outra xícara que não aquela amarela comum a todas as manhãs. Certas coisas mudam, outras se transformam. Mas algumas permanecem as mesmas: a xícara mudou, mas levantei da cama pensando em ti como de costume. Achei que talvez já tivesse lhe falado tudo o que tinha pra falar, mas tenho começado o dia - como este - querendo falar coisas que eu nem mesmo sei o que é - em parte sei. Sim, falar pra ti. Consegue perceber como estou sentando aqui, tomando café numa xícara diferente e ansioso e arfante a ponto de uma morte precoce? Percebe? 

Tenho a sensação que sua mão não alcança a minha, e isso me faz ter que me esforçar mais para fazer minhas palavras chegarem prontas e inteiras até você. Queria dizer: eu te amo, mas precisei dizer adeus porque sabia que você não seria inteiramente meu. A vida lhe queria e lhe quer. E eu vou me tornando um ser proporcionalmente ranzinza e um pouco mais triste, porque te amo, mas não posso lhe ter. Achei que por um tempo não precisaria falar de ti, mas ainda a cada nova hora e cada novo hiato da sua presença sinto você pulsando (mais forte) dentro de mim. Eu te amo e tenho medo de não conseguir suportar. É como se eu estivesse - na verdade, estou mesmo - enterrando forçosamente algo que eu não queria ou que ainda não chegou a hora. Mas preciso pra ficar vivo. 

O tempo vai passando e não consigo sair desse lugar. Às vezes tento, mas não consigo. Aí a saudade vai aumentando e aumentando, a ponto de quase ter todo o oxigênio do corpo queimado. Desculpe se falei demais como de costume, mas se você chegou até aqui, gostaria só que soubesse que penso em seu lindo rostinho todos os dias. E penso em voltar pra você. 

Arre égua, só queria falar que acordei com uma puta vontade de ter você por perto. 

Tá foda. 

quarta-feira, julho 29, 2015

O CORPO LIVRE II!



















Meu querido Despedaçado Sonho,

Esqueci de contar-te minha maior tristeza -
e talvez meu maior segredo -
antes que tivesses desistido de mim e
partido para algures.

Volta
e olha profundamente em meus olhos de vida nenhuma.
Só assim saberás.

Sinto saudade de nossos segredos,
de nosso delírio regozijante,
de nossa simbiose pulsante e
de nossas solidões imaculadas
(durante aquele começo tímido e destemido)

Será que poderias voltar e
seres completamento verdadeiro comigo?
Só assim saberás o que tenho a lhe contar.

Olha,
quando chegares,
também haverá uma lâmina ao lado da cama,
caso não consiga olhar-me e queira descobrir-me.

A HORA QUE NINGUÉM VÊ!


Ainda não me acostumei a ter que caminhar pelo corredor escuro e cheio goteiras para chegar no 404. Mas vou, como se só existisse eu; e, de fato, só existe eu enquanto atravesso esse breu asqueroso que não se parece com nada que conheço. O mínimo barulho me assusta - a goteira é um estrondo, o vento fino é uma explosão, o oxigênio é o mundo caindo. Mas cheguei - num tom um pouco esbaforido. Como em todos os outros dias, deixei os sapatos orgulhosamente novos bem juntinhos perto da porta com as meias pretas podres dentro. Nem olhei pra nada e nem precisava. Sentei na cadeira velha de couro marrom que havia sido presente de meu falecido pai, enquanto que, involuntariamente, sentia o tapete felpudo que me fazia esquecer de mais um dia ordinário. Tapete que fora presente de um grande amigo que pegou um trem sem rumo - desconfio que para o Sul - e a essa hora nem sei por onde anda mais. A última vez que nos falamos foi há 33 semanas e suas últimas palavras foram "desculpa por tudo". Acho que seu peito foi mais um que ficou vazio. Ainda o sinto pulsar dentro de mim. Fiquei impaciente quando notei tudo isso e fui pegar um ar na janela. É, ainda mantenho a mesmo a forma. Ainda sou previsível.

Este vento que anda junto com a desesperança e que bate na minha cara diz que a única razão de termos vindo parar aqui nesse lugar oblíquo e incômodo é uma espécie de teste de sobrevivência, onde por vezes tem-se que suplicar para não sucumbir lentamente. Então, caso eu não saiba e caso você não sabia, meu caro alguém, existe uma condição para se ficar aqui: é suplicar. Aí, quando se tenta se livrar da condição que se nasce, o preço pode ser alto, às vezes a loucura - há quem duvide, eu não. E essa necessidade crônica de livramento é o que chamam de liberdade. Mas aos poucos tenho descoberto que não preciso de liberdade. Ser livre é tão perigoso. Quem já foi livre? Eu já tentei uma vez. Mas descobri que sou preenchido com tudo que preciso e que a liberdade é só uma tentativa de ter mais do que se pode e do que se precisa. 

Estou aqui, bem aqui. No meio desse escuro transitório que não é fim de tarde, nem começo de noite, é a hora da Ave Maria cheia de graça, o Senhor é convosco e com quem mais? Já antecipando seu pensamento: não tenho medo desse escuro, porque, na verdade, ele me alimenta e me leva para o lugar onde a solidão fica à vontade e se refestela. Não tenho medo mesmo desse escuro, porque nele confio plenamente. Talvez porque seja o melhor esconderijo dos impropérios e barulhos diários e ninguém tem coragem de invadi-lo, porque poucos conseguem suportar o que tem nele. Só ele é capaz de me manter vivo. Nele não sinto meus membros, só o coração que é suficiente; e o pensamento acontece na medida. Não preciso procurar complementos, porque aqui eu existo e sou comigo mesmo. Aqui não preciso de palavras de complacência, como "não fique assim", ou de encorajamento como "você vai conseguir". O escuro me dá mais que isso. O escuro me ama no silêncio, na mais plena incumbência e coragem da coisa. 

Caibo nesta forma que estou e isso basta.
Sou eu bem aqui. 
E ninguém nunca vai saber.

domingo, julho 19, 2015

O CORPO LIVRE!






















Meu Querido Sonho,


gostaria de contar-lhe sobre algo que aconteceu neste dia que antecede meu dia de nascimento. Há dias não criava coragem para concretizar um sentimento que pulsava e que não conseguia criar o brio necessário para fazê-lo. Mas por vezes ficava à beira de realizar essa vontade pulsante, tomava banho, escolhia a roupa mentalmente, pegava a chave e sempre sentava no sofá para fechar o editor de textos. E desistia. Até que um dia fui. Fui e caminhei pela praça Maciel Pinheiro numa tarde de outono agradável e encontrei um papel amarelo amarrado a uma frondosa mangueira e flamulando doidamente num vento que só aparecia durante um mês do ano. Estava escrito isso:

______________________________________________


Tem gente que passa a vida fazendo perguntas em excesso. Alguém como quem vos fala que no auge dos seus 30 anos não sabe viver a vida que deveria ou simplesmente poderia viver. Alguém que no auge dos seus 30 anos ainda trava uma batalha cansativa e insistentemente inconsequente com a intangível querida vida que ninguém sabe nem o que é.

Pergunte a alguém o que é vida e  depois me conte as respostas. Talvez você e as pessoas as quais você ousou perguntar precisem de uma tarde inteira estabelecendo um diálogo hipotético ou simplesmente uma tarde em que você ouça-as falando ininterruptamente e absorto num pouquinho de cada teoria, às vezes beirando nem estar de verdade ali, involuntariamente. Uma hora Platão vai aparecer e por mais que a outra pessoa não goste, vai ficar um pouco pensativo sobre o fato de ser o primeiro a saber que as coisas questionáveis do mundo não têm resposta.

É por isso que me decido tanto a saber o que é vida; gostaria de ajudar as pessoas de alguma forma e quem sabe ajudar a mim mesmo também. Além disso, mais nunca mais fui pioneiro em nada e morreria por ser conhecido por um corte epistemológico. Não seria encantador? Ou assustador? Porque muita gente passaria a me conhecer, e não sei se suportaria. Há tanta gente no planeta e ninguém soube o que dizer. Ou talvez não tenha procurado direito.

Tenho um cavalo, uma plantação de dois hectares de avelã e uma coleção de canivetes. Mas certa vez encontrei um homem de aparência triste no caminho para a cidade que me pediu uma avelã e me disse que nada disso acalma a insegurança dentro do coração. Precisei de dois anos para entender e saber o que é preciso para ser pleno e seguro de si, e cheguei a conclusão que, na verdade, só é preciso ser você mesmo e ter a consciência de que ser você mesmo faz bem aos outros.

Aí, você que me lê - assim espero - me pergunta: “como alguém que vive a vida se perguntando chegou á conclusão de alguma coisa?”. Eu respondo: “eu apenas sinto, sou eu mesmo e não preciso provar nada pra ninguém”.

Só quero dizer que tive coragem.

Desejo-lhe coragem.

Coragem.

"Antes o sofrimento legítimo que o prazer forçado".
Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres
Clarice Lispector

segunda-feira, julho 06, 2015

AU PARADIS!
















Amo-te no silêncio.
Não no silêncio entre as coníferas de Helsinque,
ou nas montanhas do Atacama,
ou na Rua de Santa Rosa de madrugada,
tampouco neste ar nefasto e indissolúvel de domingo.
Amo-te mesmo é no silêncio entre as coisas que não precisam ser ditas
e entre as que são poluidamente faladas e não se ouve,
pois se está amando.

DIÁLOGO PÓS-MODERNO!















- Add.
  ...
- Sdd.

O mundo escorreu.

domingo, julho 05, 2015

SELEÇÃO NATURAL!


















Este corpo cansado nunca pediu por nada e mesmo assim carrega diariamente fardos de fatos velados pelo que nunca pediu e vive uma via-crucis por dia. O corpo que ama, chora, clama, deseja, envelhece, que pede mais a cada trovão que ricocheteia no coração. Este corpo que precisa aceitar todas as condições que lhe são impostas em todos os instantes dessa arbitrariedade que chamam de vida. E vida é coisa que não existe. O que existe e onde se está nesse momento, na verdade, não tem nome. Qual o propósito de estar nesse lugar em que a imprevisibilidade pode ser não existir mais no instante seguinte? Então continuo com tudo de mim e com tudo em mim. 

Desde já, desculpe. Desculpe se sou demais e lhe assusto. Desculpe se amo demais, se sou tudo demais, e deixo minhas entranhas em carne viva para quem quiser olhar e provavelmente pensar "olha, como estão avermelhadamente sentimentais!". É que sou excessivo por natureza e não nasci para ser na medida. Não nasci para amar na medida, para sofrer na medida, pensar na medida, não nasci para os limites. Ou na verdade, nasci para aos limites, porque assim como todo ser humano inconscientemente frágil e limitado todo meu excesso também chega a um nível de coragem que beira esgotar a adrenalina, mas num vulto decresce e se estabiliza, neutralizando-me, deixando-me inerme e sem reação para tudo, principalmente, para pensar. Meu suposto excesso é uma salvação ou a destruição do corpo de uma vez.  

Mas vou.
Apenas sigo no fantasia e na realidade, sendo eu.
Eu:
Um animal que segue a naturalidade do que foi destinado a ser:
.

quinta-feira, julho 02, 2015

DIÁLOGO SOBRE O AMOR!




















"Eu te amo porque te amo".
Carlos Drummond de Andrade

 Poderias formalmente dizer-me o que é o amor? É que ando tão cansado que vivo
racionalizando e buscando atalhos para achar explicação para nirvanas e chegar nos
confins da vida.Tenho uma pressa descomunal para cumprir meu papel nesse mundo.

– Por que te deixas serdes tomado por tamanha limitância que é saber do que se trata o
amor? Amor é uma coisa só e tem unidade única. Penetra por direito e não pode ser
consciente. Esquece de ti mesmo, e sente as coisas fantásticas chegarem, porque nem os
gregos saberiam o que lhe falar. Apenas sinta.

domingo, junho 28, 2015

CEGUEIRA!

Aquele que te amava
cansa tua aura:
respira,
pois chegou o novo amor.

_________________________

Estavas de tanta conversa
com o passado, baby,
que não viste que tirei meu coração e
coloquei em ti.

sábado, junho 27, 2015

AMOR INVISÍVEL!























Se tu preferires, recuo.
Recuo até o infindo estado que prezo por nunca sair, mas saio.
Saio, porque me chamam e quero, e
Quero me revirar e me refestelar no desconhecido, e
corajosamente me atrever a sobrepor o medo e amar,
Amar desmedidamente até o fim dos meus últimos instantes.
Se me deixares.

Se me deixares.
Se me deixares aqui estaticamente defronte a ti,
e deixares essa parede invisível ir aumentando,
e meu coração ir se expandindo,
e meu amor aumentando,
e eu aumentando,
e o tempo tomando conta de tudo,
e não deixares tudo que tenho transbordar,
recuarei,
e num suspiro único
voltarei ao estado que nunca pedi pra sair.

Basta teu coração não ter mais nada a dizer-me.

Diz-me, porque
O limbo machuca tanto.

VITÓRIA!

Se faltar amor,
amo em dobro
até o fim.

terça-feira, junho 16, 2015

SER HUMANO!
















Me encontro encurralado sem saber ser. 
Só as palavras de afago de Carlos que me dão lágrimas nos olhos, mas que hoje passam e se soltam do varal me deixando de mão no queixo, 
unhas arrancadas sutilmente 
e um suspiro desmotivado como quem imagina a falta de propósito. 
Tive coragem lá dentro do ímo, mas foi dias atrás. 
Agora me agarro na barriga da minha querida mãe, como um macaco em seus necessários primeiros tempos de vida. 
Tempo já quase não tenho. 
Vida é aos poucos. 
Sou ser humano da espécie sentimental que participa da competição racional 
não sabe o que vai ser do dia seguinte,
quem vai ser no dia seguinte, 
que precisa de companhias de cabeceira, 
que cronometra os números, 
que o corpo dói, 
que sente medo 
não sabe se tem alguém.

DIÁLOGO!

















Escuta meu coração. Mas se vais escutá-lo, saiba que ele morre de medo da solidão:

"Godard me estragou.
A melancolia me tomou.

Bergman não conseguiu me salvar.
O corpo todo dia ficar sem ar.

Me apaixono no escuro.
Em todo calor me misturo.

A distância se aninha.
A alma definha.

Preciso da fantasia.
As horas são apoplexia.

Tenho a insuficiência por natureza.
As pulsações consomem em extrema dureza.

As mãos vicinalmente tremem.
Os mundos envelhecem.

Sou puramente triste.
Choro na virada da rua vinte.

Saudade me cansa.
Não sei se resisto à ânsia.

Ainda amo e morro à mesma hora.
Onde estão as escoras?".

Sinto-te afastar-se do meu corpo.
O que descobriste?
Ainda tens a coragem de escutar-me diariamente?

Conta-me, porque já sei que as verdades não podem ser mitigadas.

sexta-feira, junho 12, 2015

SEM TÍTULO

Amor.

Fulminante
é fulminante
aos poucos é fulminante.

Basta um ar.
Dia ordinário.
Espera chegar.

ah.
passarinhos.
há.
amor.
mora.
morada.
dia especial.
vida simbiótica.
thauma.
amora.
ramo.
te dou.
tanto.
estufa o peito.
te amo.
não falta mais nada.

O que escrevo nunca será suficiente, apenas
vivo continuamente em linha reta expondo o que em mim tem de mais verdadeiro.

quinta-feira, junho 11, 2015

A VERDADE QUE ESTÁS PRESTES A ME DIZER!

























A verdade que estás prestes a me dizer não pode ser mitigada.


Não importa de onde seja dita.
Diz-me de frente, de costas,
de perto, de lá do fim do mundo.
Sentirei no âmago.

Verdades não podem ser mitigadas.
Circulam, cavam, matam, pronto.
O resto vai saindo pelas linhas, poros e pelos do corpo.
O resto é a vida que tem que se amar do mesmo jeito.

domingo, junho 07, 2015

REPETIÇÃO (END OF CALL)!

















"Amor será dar de presente um ao outro a própria solidão?"
Clarice Lispector 


Logo
seremos
apenas uma lembrança rarefeita
na mente um do outro.

E a culpa não é de ser humano nenhum.

domingo, maio 31, 2015

LATITUDES & HEARTBEATS!
















Sentei no chão da cozinha e, enquanto segurava aquela carta branca endereçada de Montevidéu, vivi uma espécie de frenesi misturado a um ardor infernal que fazia meus batimentos voarem. Com um nó na garganta, olhei o envelope fixamente e não sabia se teria coragem de abrir, mesmo com uma ansiedade que me fazia querer abraçar o que não existia ou que não tinha nome. 

Estava farto de surpresas, partidas e recomeços, e não queria que minha vida suficientemente rasa se revirasse e transformasse de novo, o que por um tempo até gostei, achando que tudo isso era meu oxigênio já transformado em energia. Mas sabia que desde o momento em que tive aquela carta em minhas mãos, minha vida já não era a mesma mais uma vez. Gostaria apenas de viver sem as coisas intangíveis e simplesmente repetir a rotina até morrer: subir as duas ladeiras de Santa Tereza, virar à esquerda, abrir o portão cinza, fechar a porta branca, tirar o sapato, sentar no jardim, olhar as estrelas, pensar em amores e dormir. 

Por um instante, sentado naquele chão gelado, desviei o olhar e fitei o trecho de um poema de Rimbaud que colocara na geladeira há 11 anos: 

"Pois tu me liberas
Das humanas quimeras,
Dos anseios vãos!
Tu voas então..."

Nesse momento, o tempo, o silêncio e todas as interferências de um plano físico pareciam ter sumido, e só existia eu. Um eu que sempre precisou do vazio e do nada para sobreviver, mas que por vezes tinha a esperança como carrasca. Não sabia se conseguiria passar por esse limbo outra vez. E meu cansaço ia aumentado proporcionalmente à vontade de chorar, o que há muito não fazia. Apoiei os braços sobre o joelho e como um explorador cauteloso que não sabe o que vai encontrar, comecei delicadamente a abrir a carta. Eis:

_________________________

03/02/1995

Sei que prometi não te deixar, mas precisei ir.  


Desde então, já se passaram 11 anos e 2 meses, mas ainda lembro como se fosse hoje e sinto como se fosse hoje a primeira vez que tomamos conhecimento da existência completa um do outro, o que não precisou de muito tempo. Ouvi as batidas do seu coração de longe, mesmo você estando no seu estado mais calmo do mundo como sempre foste. Aí, do outro lado da rua, olhaste-me com a serenidade de um flamingo que não incomoda, e, então, nos encontramos. A partir dali eu não sabia o que fazer, porque tive um sentimento vertiginoso e começava a lhe querer mesmo assim, porque aos poucos a energia de teus olhos me contava que estavas com disposição para partilhar solidão. Precisávamos um do outro, e cada instante precisava cronicamente da tua presença.  

Ouvi seu coração bater num ritmo crescente que beirava a explosão. Era a primeira que ouvia o coração de alguém bater tão de longe, mas tão de perto e forte, e nem sabia que isso era possível, o tanto que tentei me livrar momentaneamente da sensação, mexendo nos ouvidos e apertando os olhos. Achei que pudesse ser a loucura que tentava se apossar por estar tanto tempo sozinho. Mas não era. Também não era sonho, porque sonho, nem ilusão, porque lhe via materializado. 

Foi então que parei de pensar por um segundo e neste exato curto lapso de tempo foi onde me conectei a ti de uma vez. A batida acelerada de seu coração virou trilha sonora enquanto via-te imóvel com as mãos ansiosas e rente ao corpo. Quanto mais olhava, mais tinha vontade de tirar-te dali, mas não sabia como. Queria, mas talvez o medo que lhe habitava por ter passado tanto tempo só e o abismo que nos mantinha separados, fazia com pensasses que eu não existia. Mas, sim, eu existia em carne, corpo, espírito e salvação. Era isso. Eu era tua salvação e estava ali para ser inteiramente seu, partilhar da mesma solidão, segurar tua mão, abraçar-te nas tempestades, cuidar de todas as tuas febres, manter uma amizade verdadeira e viver uma aventura que não recordava de ter vivido.

Talvez o que tenha nos afastado foi sua incredulidade em mim, mesmo eu dizendo todos os dias que gostava de ti - o que era recíproco. Mas sei que a dificuldade em atravessar a rua era o causava seu temor sobre mim e que aumentava sua insegurança. Mas não era impossível atravessar, bastava paciência. Infelizmente, não consegui lhe tirar daquele lugar e o que me restou foi olhar-te em progressiva apatia e sentir as batidas de teu coração esmorecerem pouco a pouco - o que automaticamente me fez começar a entrar num mesmo estado de apatia e tristeza porque não queria me separar de ti. Mas precisei, porque teu medo nos afastou.  

Desculpe, eu estava aqui sentado e resolvi contar o que sinto e não consegui falar.






Fim
...

sexta-feira, maio 29, 2015

OS DOIS EXTREMOS DO MUNDO!























Foi lindo aquele dia em a coragem tomou teu corpo e sorrateiramente foste segurando  minha mão com uma delicadeza e um envolvimento tão grande, que esqueci que eu existia bem aqui, no olho desse furacão que é a vida na Terra. A cada nanocentrímetro meu que era tocado, uma parte por vez do meu corpo ia sendo desaquietada e respondia internamente com pululos bruscos de um ar quente que se expandia e se comprimia descompassadamente. À medida que esse movimento descontrolado se intensificava, chamava por um Deus que nem sabia se me ouvia e pedia que aquilo que, hora era prazer, hora era afago, nunca acabasse. Não, não  ficaria alí até o sol nascer por três dias seguidos, isso é pouco, mas uma vida inteira, porque não meço nada. 

Aí o tempo parecia ir mais devagar, mesmo que nós dois estivéssemos nos movendo na velocidade de um raio agressivo que procura seu destino, caminhando para alguma coisa que nem nós mesmos conhecíamos. Eu com um medo vacilante, mas com a sede de viver todas as inconsequências de um jovem de uma vez só; você calado sem dar uma pista sobre seu âmago, mas com o calor de quem tem o amor no lugar do sangue. 

Todas as vezes que tua mão se encaixava organicamente na minha era como se fôssemos um do outro e, então, me sentia guardado com um carinho enorme. E cada vez que ela voltava suavemente a deslizar sobre a minha e devorava-a por completo sentia mais vontade de tê-la. Uma vontade que, aliada a tuas promessas de amor, me tirava as palavras, deixando-me inerme, somente com uma tímida sensualidade que intencionava lhe dizer "este corpo necessita de ti".Você se lembra? Por hora, parecia que nossas almas eram duas velhas conhecidas e amigas, que nunca se separaram, e que em todos os corpos que já habitaram, deram um jeito de encontrar e se amar. 

Por essa hora estás aqui, com a cabeça cansada em meu peito, ouvindo pornograficamente meu coração exibir regozijo e desalento, enquanto o domingo passa, e esperando que as maiores e melhores coisas do mundo saiam de dentro de mim e crescentemente lhe invadam, dia após dias, silêncio vencido após silêncio vencido. Foste chegando, chegando, eu não sabia o que fazer, simplesmente aceitei, e de repente, já tinhas fincado um hospedeiro dentro de mim que me fazia suplicar por sua presença todos os dias, o dia inteiro, sem que nem mesmo pudesse perceber que, na verdade, a falta de frio que faz agora, é calor em excesso absorvido de ti. 

Em nosso primeiro hiato, senti falta da tua voz e a ouvia principalmente nos lugares mais barulhentos por onde passava. No segundo hiato, senti falta da tua companhia que mesmo em tão pouco tempo de convívio já era como um destino certo que queria abraçar. No terceiro, não conseguia mais respirar e definhava com o frio agravado pela solidão de uma cidade em que as pessoas não se olham. 

Você ali, repousado sobre em mim, nossa respiração de dois seres equilibradamente vacilantes se fundiam, e uma atmosfera utópica aparecia. Por um momento achei foste me abraçar forte e nunca mais me largaria. Mas tenho mais medo porque somos seres humanos. Somos dois corpos. Somos dois animais instintivos. Somos dois, e não sei se consigo fundir-nos, porque não sou forte o suficiente pra suportar viver sem ler pensamentos. 

Fica aqui, segura minha mão e vamos escolher qual será o próximo extremo que iremos juntos.

domingo, maio 17, 2015

INÉRCIA!
















Defronte a ti,
Olhei-te destemidamente em meio a uma lisergia suave e
Misturei-me a mangues densos, incertezas.

Num rastejo de perigosa emoção,
Senti como quem dispara um tiro no escuro,
E arfantemente, amei-te na mesma hora dentro de mim.
Mais dentro de mim, de mim, de mim, de mimdemimdemimdemim,
penetrando displicentemente o inexistente no coração.

Mas, dentro de mim, o que acontece se mantém imaculado e
nunca se transforma, apenas fica e circula, como a sensação de
sentir o movimento infinitamente agoniante da Terra.

Fiquei inerte.

Temi a revolução.

Olhei-te.
Esgotei-te.
Amei-te
uma
última
vez.

O instante já era outro.

INTRANSPONIBILIDADE!





   Parece que o país vai se acabar dominado por uma loucura que fatalmente cega. São tempos catabólicos. E eu só consigo pensar que desde que estive no Rio de Janeiro pela primeira vez, no mês passado, uma das maiores preocupações da minha vida sempre foi ter aquele buffet de jacarandá com pés palito que vi numa loja de esquina, em Botafogo. Desculpe, é que me apaixono rápido demais e passo tantas noites sem dormir cultivando e cuidando (dos sentimentos) que não consigo lidar com impropérios que exigem de mim ser uma máquina ou um deus do Olimpo. 

Os tempos mudaram desde voltei e desci na plataforma do trem naquele outono de 1968, carregando só uma mala parda e o casaco no mesmo tom que só servira para charme. Notei, então, só pelo ar, que algumas coisas se perderam e outras foram extinguidas à força. Senti uma vontade imensa de sentar na plataforma com as pernas livres e suspensas sobre os trilhos. Mas depois de olhar ao redor e imaginar que poderia haver uma certa coerção, baixei a cabeça e tomei meu rumo até os bancos de madeira que, para minha surpresa, haviam sido agressivamente pintados de verde. 

Coloquei a pequena bagagem sobre o colo e repousei o casaco sobre o braço, e, aos poucos, tentei achar uma posição confortável o que parecia quase impossível pelo fato da curvatura do banco não ser nada ergonômica e pela agonia que me tomava por não entender o porquê de terem pintado o banco de verde. Não tinha nada a ver com o resto da estação que era toda projetada com motivos art déco em tons terrosos e detalhes de ferro. Pensei como algumas decisões na vida são arbitrárias e desprovidas de qualquer mensuração de consequência. E isso não tem nada a ver com inconsequência, é outra coisa completamente diferente. Ali eu tive vontade de não sentir mais a mesma vida que vinha sentindo. 

Irrequieto com tudo isso, à medida que cada pensamento era um golpe que secava a garganta, tentava manter a paciência de esperar o segundo e último trem até a estação mais próxima da pensão. É, os tempos me afetam, mas não consigo reagir. Enquanto, olhava o céu nebuloso, me dei conta que muita coisa ainda se repete: continuo amando rápido do mesmo jeito; continuo com as mãos suando quando me olham demais; continuo na tentativa de ler pensamentos anônimos e intrigado com a gente que se porta serenamente na estação; continuo querendo a solidão e uma revolução ao mesmo tempo na minha vida; continuo sem saber se acredito em mim mesmo. Todas são muito resistentes a mudança. E para cada coisa repetida, formavam-se ramificações de 10, 15 até 20 sub-pensamentos. E sempre termina no nada.

Por isso, ao mesmo tempo que tenho um medo danado de simplesmente viver, sem ficar pensando e falando demais ou em quais horas devo ser racional ou emocional, tenho uma vontade crônica que fica pulsando na cabeça de dizer todos os dias coisas de afeto, coisas que se sente e que precisam ser ditas antes que transbordem. 

Como fica o corpo que não diz nada? Não sei se tento esquecer do mundo de uma vez por todas ou se continuo. Gostaria que as coisas fossem mais simples. Que sentir fosse mais simples. Que viver fosse mais simples. Que se apaixonar fosse mais simples. Que saudade fosse mais simples. Que ser um animal pensante fosse somente um detalhe. Que a ordem natural das coisas fosse mais simples. Nem o natural é simples, porque, na verdade, é só forma de tentar mascarar o que não se sabe ou não se consegue fazer. Não vou dizer que preferia não sentir nada disso. Não, eu quero, até porque faz parte da essência humana. 

Mas é preciso não esperar nada e se tem uma que já tentei nessa vida foi viver sem expectativa, e digo: "quase morri". Aliás, esqueci o relógio em algum lugar, o da estação parou e enquanto estava absorto em tudo que a volta para a cidade me causou, todos foram embora sem que sequer percebesse. Não tinha mais como saber a hora, nem quando o trem iria chegar. Ia ter que esperar o trem não sei mais por quanto tempo. Sozinho. 

A VIDA QUE NÃO TEM FIM!

Desde a partida de Carlos Andrade, tenho lidado bem com despedidas, expectativas e esquecimentos. Não precisei pensar muito ou esperar uma epifania para sentir profundamente que uma hora esquece-se tudo que se quer ou o que se precisa esquecer, e que qualquer apelo para lembrança será indiferente. Mas acho até que esqueci demais, esqueci o que não queria, o que não precisava ou não deveria. Esqueci de mim mesmo. Aí passei a perambular por uma inconsequência como quem apenas sobrevive esperando que a vida acabe no instante seguinte ou simplesmente como alguém que foi sufocado uma vida inteira e agora clama por uma liberdade de ser, a qual se caça como o último animal da temporada no bosque. O animal é muito maior que tudo e que eu, sem precisar fazer qualquer esforço. Fitei-o, e fui levado a seu ninho sem qualquer relutância.  

Mas dizem que tudo na vida tem uma consequência, aí é-se obrigado a aceitar o que vier na tentativa de se viver em paz. Isso talvez seja um outro problema, mais um problema, o que me faz crer que uma vida assim é impossível. Achei que tivesse conseguido bem sem nada, e cheguei a viver por um tempo sem sentir falta de nada e medo de nada ou de ninguém. Mas basta um estalo para perceber que tudo é igual, que a tristeza é uma amiga fiel, a saudade é uma extensão da alma e, que esse tempo destemidamente diferente não passou de uma alucinação febril. Então, começo tudo de novo, o que é uma coisa fadada a mim. Sou essencialmente nada. Nada porque o nada em um momento já foi tudo. Nunca consigo me transformar, apenas volto para o que sempre fui, depois da morte de cada ciclo que se encerra naturalmente ou que sou obrigado a encerrar. E começar tudo do começo cansa tanto. 

Passei um tempo sendo cuidado por aquele animal, em estado de encubação. Sempre estive certo que era aquilo que queria e precisava, e fui vivendo, me alimentando, a fim de me tornar um filhote da liberdade suficientemente pronto para ser a própria liberdade. Sempre achei que procurava uma liberdade, uma liberdade salvadora, que me desse a ávida esperança de experimentar a normalidade cartesiana das coisas. A liberdade do calor que Carlos Andrade me dera, na verdade, que eu tentara sugar para suprir a falta de seu toque invisível. Mas a verdade é que sempre procurei Carlos Andrade em todos os lugares, a vida inteira. Esse é o motivo de tanta agonia. É desespero. A verdade é que a liberdade é eternamente cíclica e que Carlos Andrade estará em qualquer lugar que eu for.

É tão cansativo mesmo que, às vezes, só o que se quer é uma mão para segurar.
Entende o que digo?

sexta-feira, março 13, 2015

COUP DE TOUT (O MAIOR SEGREDO DAS AVENTURAS)























Acordei quatro e meia da manhã com a sensação de uma amplitude térmica que jamais sentira e imaginara aqui. Às vezes subestimo a capacidade de tudo me surpreender, e, às vezes, não me deixo mesmo surpreender nem pelos lugares, pessoas, animais ou coisas. Tão cedo, tão abrupto e eu já com uma sensação completamente clara que agoniava cronicamente corpo e subconsciente, e que eu nem sabia o que fazer com aquela coisa toda de repente que ao mesmo tempo me fazia querer correr e ficar inerte. 

Levantei com a estranheza pulsante de quem acorda ansioso para começar algo novo. No meu caso, voltar a ser sozinho mais uma vez, do jeito que sempre fui, do jeito que sempre amei, mas do jeito nunca me permitiram, porque sempre tentam me tirar da minha verdadeira origem. Na verdade, a solidão é algo intrínseco a quem mora na cidade de São Paulo; tem-se a ilusão de se ter algo, mas não se tem nada, apenas a certeza de que as coisas "simplesmente existem" como bem disse um outro amigo meu que mora aqui perto, mas só vejo no máximo seis vezes por ano. Levantei como não se não sentisse o chão e involuntariamente fui até o sofá, onde continuei a sentir um frio descomunal. 

Sempre soube que entre às quatro e cinco da manhã as coisas não são fáceis. Existe um ar pesado que se mistura a um silêncio tão bruto que parece ganhar vida e que faria até Poe vacilar. Já havia sentido medo repetidas vezes, até porque já havia sido obrigado a recomeçar a solidão infinitas vezes, e isso me causa um medo grande demais. É que o costume em não sentir mais nada só vem aos poucos. Mas agora foi diferente, talvez porque criei a consciência da naturalidade de se ser plenamente só. 

Enquanto, me recolhia mais e mais no sofá, talvez tentando voltar ao estado de segurança fetal, e era violentado pela agressividade e calmaria da madrugada pensei em tomar um café, mas me ative. Há certo tempo tenho vivido com uma vontade de vomitar que me acomete sempre depois do momento em que termino de ingerir meu sagrado café matinal.Ou simplesmente meu café, porque sagrado é uma coisa que venho refletindo. Sagrado remete a algo que é tão importante, tão caro e tão certo no coração e na mente que não sei se cabe ou se se encaixa perfeitamente nos meus dias, que andam bagunçados a ponto de não saber o que fazer mais o que fazer com eles. Eles que me fazem. Talvez seja por isso que o café - uma das coisas mais importantes da minha vida - não se sinta mais a vontade dentro de mim. Eu disse que esse seria um tempo difícil. Aí, na tentativa de deixar tudo isso menos, somente menos, resolvi começar a fazer uma coisa que me deixa vivo, mas que não o faço há meses. Sentei na mesa, peguei o papel de sempre e comecei:

Amo aventuras. Sempre amei, e quando me levam ou 
entro em alguma fecho os olhos suavemente para sentir a força e
o prazer com que, deliciosamente, me arrebata e me arrebenta a
sobrevivência, e toda a intensidade e voluptuosidade delas agindo
sobre mim, escorrendo quente pela boca,  à medida que 
vou perdendo o controle da vida sobre mim e
potencializando o espírito de liberdade adolescente.

Amo como elas me prendem, 
me percorrem abruptamente e 
me fazem querer viver coup de tout
sem me importar se o fim vai ser verossímil ou se mesmo vai ter fim, 
desprezando os rastros de restos que me ficam velados.


Simplesmente me entrego.


E agora fui de uma vez, 
tomado por um sentimento tão delicado que acalma e irrequieta o coração,
deixando a respiração arfante, e 
por um fluído sensual que sinto, mas nunca vi,
só conheço nas mais ontológicas profundezas
da fusão entre desejo e reprimenda; 
é onde se conhece céu e inferno.
Egoísmo de quem sabe o que diz, e que
não é menos que um homem ordinário e
não mais que Dom Quixote.
Dom Quixote.
É dom.
Dom se nasce. Não se nega.
Nunca tive medo, mesmo tomado por
uma ardência que me faz ficar cansado e
querer desistir de tudo.


Não consigo parar, e
Se tento é como se um raio enfeitiçado me atingisse e
ficasse paralisado de vez.


Alguns amam os espíritos que enxergam;
eu amo as aventuras, que me matam e
me fazem ter um rumo, mesmo sem saber qual é.