sábado, dezembro 22, 2012

A VIDA QUE PASSOU A SECO!

Engoli a água da torneira; passou a seco. Levantei suavemente a manga da camisa morna num movimento ascendente, como se o mundo não tivesse pressa e o tempo não fosse nefasto, criando coragem para ver a imagem da tristeza e a história de uma vida cheia de oração e desespero no espelho. Vi a formiga, que não sabia se me olhava, me detestava, me temia, me desprezava. Não entendi. Me preocupei só com a guerra que sou eu, mas tive cuidado ao me debruçar na pia com a lamúria que me segue, não sei se com pena, não sei se complacente com a fragilidade, não sei do que se trata. Só olhei e vi que vão sou eu. Olhei para o rosto que ninguém prestou atenção, encarando as juras escondidas e o costume da solidão - solidão de sol, solidão de acalanto, solidão.

segunda-feira, dezembro 17, 2012

TEU CASTELO!

Tenho o corpo exalando lavanda e a boca pura de ambrosia resguardados para quando saíres de teu castelo e voltares a me ver. A ânsia da tua presença escorre dentre minhas vísceras, que reclamam, e fatigaram de esperar pela cura que só tua mão perante meu rosto há. Não sei se sobreviverei a esse caos de envelhecer vendo tua vida ser levada para outro acalanto que não meu coração. Como estou inerme! Quase perco o rumo da sanidade, porque não queres perceber como me inebriei das mais belas prosas pra lhe falar, deixando meu peito tão inefável. Queria ouvir tua graça debruçado na janela de parreiras, e me deleitar nesse prazer sublime inelutavelmente. Por quê não vens, amor, e recosta-te ao meu lado? Por quê não vens, amor, e és bom para mim? 

domingo, dezembro 16, 2012

A MORAL INTOCÁVEL!


O intocável de tua moral sentou-se suavemente em meu leito casto ao passo que minha vontade de resistir à ousadia do meu coração em admirar sua beleza inabalável, inalcançável desmoronava voluntariamente. Estávamos na canícula, e meu interior desmedido tentava, porém não reconhecia mais as transmissões de razão depositada em cada ser. Aos poucos resili o pacto com as proibições que me impus, contando-lhe meus segredos e pondo minha alma gasta, ingênua e cheia de enfrentamentos em teus ouvidos, em tuas mãos. Mas me fizeste de tolo, fingindo estar  atento a cada palavra de confissão que sinceramente lhe entreguei, pedindo esperançosamente que minha súplica e meu amor sedento ali implícito lhe fizessem estender a mim sua complacência e reciprocidade. Fui alto e abracei a culpa de ser amante, daqueles que se conformam e se esquecem de odiar e, padecem na constância da saudade.

sábado, dezembro 15, 2012

SILÊNCIO, AMOR!


Silêncio, amor. Peço-lhe calma enquanto machuca-me e sussurra em meu ouvido o sopro seco da solidão. Meu coração fica tímido, e não sabes porquê a esperança e a bem vivência e a temperatura constante não me pertencem mais? Tenho calafrios e arrepios, e as marcas de inúmeras formas e tamanhos amargadas na dor da ilusão. Peço-lhe calma, por favor, ao fitar meus olhos de tem-medo-da-vida, que não discernem a intenção e só pensam no imo de frieza e do mistério que tens. Sejas carrasco penoso quando fizeres seu destino de colocar toda sua ira em desgraçar minha vida, para que vagarosamente possa desfrutar da letalidade de você. Tenho que lhe dizer: sou ser humano assíduo, acordando - vivendo e dormindo - sofrendo; e ainda sou ser humano que dissimula e disfarça para distrair esse amor nefasto, ávido, febril, cansado, nervoso que sinto por você. Silêncio, amor. 

terça-feira, dezembro 11, 2012

O TRAJE!

Uma lâmina afiada atravessa a cabeça da criatura que sou eu, pondo em inquietude o mundo que me contém ao mesmo tempo aquietando as mãos que deposito por cima da roupa que cobre o corpo intocado. Meus olhos dizem: tenho sede de júbilos e amor, mas não me enervo exacerbadamente; só quando penso no jacinto mais bonito que tenho nos fundos de casa para lhe dar em todas as vezes que vens me visitar e quero lhe pedir para ficar. Sinto sempre o medo de ser o último adeus e também o conforto de não ter a alma atormentada pela presença indecisa, sem brio. Me desprendo da propriedade de ser alguém nesse tempo, em todos os tempos  e, peço que refestele-se sobre meu coração, e pese sobre mim até o momento em que nossas vidas não existam mais.

quarta-feira, dezembro 05, 2012

A EMPRESA DE CARTÕES FESTIVOS!

Frágil como um moço algures, não tenho segunda pele. Não tenho reações felinas ou animalescas que denotem uma vida forte saindo de dentro, não tenho. Tenho a alma velha de cabeça baixa, de palavras entaladas que atiçam a úvula, que finge que não vê o tempo tomando conta, porque anseia a pressa do dia seguinte, do ano que vem, da vez de ser alguém. Tenho tantos poucos anos, e ainda não criei veias nos braços. Não quero ser robô que veste terno e gravata para a vida inteira achincalhado numa empresa de cartões festivos, escrevendo e desfazendo farewells, desperdiçando a melancolia de Carlos e Clarice. Quero ser o que jamais fui. Quero ser o que hei de ser. Quero ser o que preciso.