quarta-feira, julho 29, 2015

O CORPO LIVRE II!



















Meu querido Despedaçado Sonho,

Esqueci de contar-te minha maior tristeza -
e talvez meu maior segredo -
antes que tivesses desistido de mim e
partido para algures.

Volta
e olha profundamente em meus olhos de vida nenhuma.
Só assim saberás.

Sinto saudade de nossos segredos,
de nosso delírio regozijante,
de nossa simbiose pulsante e
de nossas solidões imaculadas
(durante aquele começo tímido e destemido)

Será que poderias voltar e
seres completamento verdadeiro comigo?
Só assim saberás o que tenho a lhe contar.

Olha,
quando chegares,
também haverá uma lâmina ao lado da cama,
caso não consiga olhar-me e queira descobrir-me.

A HORA QUE NINGUÉM VÊ!


Ainda não me acostumei a ter que caminhar pelo corredor escuro e cheio goteiras para chegar no 404. Mas vou, como se só existisse eu; e, de fato, só existe eu enquanto atravesso esse breu asqueroso que não se parece com nada que conheço. O mínimo barulho me assusta - a goteira é um estrondo, o vento fino é uma explosão, o oxigênio é o mundo caindo. Mas cheguei - num tom um pouco esbaforido. Como em todos os outros dias, deixei os sapatos orgulhosamente novos bem juntinhos perto da porta com as meias pretas podres dentro. Nem olhei pra nada e nem precisava. Sentei na cadeira velha de couro marrom que havia sido presente de meu falecido pai, enquanto que, involuntariamente, sentia o tapete felpudo que me fazia esquecer de mais um dia ordinário. Tapete que fora presente de um grande amigo que pegou um trem sem rumo - desconfio que para o Sul - e a essa hora nem sei por onde anda mais. A última vez que nos falamos foi há 33 semanas e suas últimas palavras foram "desculpa por tudo". Acho que seu peito foi mais um que ficou vazio. Ainda o sinto pulsar dentro de mim. Fiquei impaciente quando notei tudo isso e fui pegar um ar na janela. É, ainda mantenho a mesmo a forma. Ainda sou previsível.

Este vento que anda junto com a desesperança e que bate na minha cara diz que a única razão de termos vindo parar aqui nesse lugar oblíquo e incômodo é uma espécie de teste de sobrevivência, onde por vezes tem-se que suplicar para não sucumbir lentamente. Então, caso eu não saiba e caso você não sabia, meu caro alguém, existe uma condição para se ficar aqui: é suplicar. Aí, quando se tenta se livrar da condição que se nasce, o preço pode ser alto, às vezes a loucura - há quem duvide, eu não. E essa necessidade crônica de livramento é o que chamam de liberdade. Mas aos poucos tenho descoberto que não preciso de liberdade. Ser livre é tão perigoso. Quem já foi livre? Eu já tentei uma vez. Mas descobri que sou preenchido com tudo que preciso e que a liberdade é só uma tentativa de ter mais do que se pode e do que se precisa. 

Estou aqui, bem aqui. No meio desse escuro transitório que não é fim de tarde, nem começo de noite, é a hora da Ave Maria cheia de graça, o Senhor é convosco e com quem mais? Já antecipando seu pensamento: não tenho medo desse escuro, porque, na verdade, ele me alimenta e me leva para o lugar onde a solidão fica à vontade e se refestela. Não tenho medo mesmo desse escuro, porque nele confio plenamente. Talvez porque seja o melhor esconderijo dos impropérios e barulhos diários e ninguém tem coragem de invadi-lo, porque poucos conseguem suportar o que tem nele. Só ele é capaz de me manter vivo. Nele não sinto meus membros, só o coração que é suficiente; e o pensamento acontece na medida. Não preciso procurar complementos, porque aqui eu existo e sou comigo mesmo. Aqui não preciso de palavras de complacência, como "não fique assim", ou de encorajamento como "você vai conseguir". O escuro me dá mais que isso. O escuro me ama no silêncio, na mais plena incumbência e coragem da coisa. 

Caibo nesta forma que estou e isso basta.
Sou eu bem aqui. 
E ninguém nunca vai saber.

domingo, julho 19, 2015

O CORPO LIVRE!






















Meu Querido Sonho,


gostaria de contar-lhe sobre algo que aconteceu neste dia que antecede meu dia de nascimento. Há dias não criava coragem para concretizar um sentimento que pulsava e que não conseguia criar o brio necessário para fazê-lo. Mas por vezes ficava à beira de realizar essa vontade pulsante, tomava banho, escolhia a roupa mentalmente, pegava a chave e sempre sentava no sofá para fechar o editor de textos. E desistia. Até que um dia fui. Fui e caminhei pela praça Maciel Pinheiro numa tarde de outono agradável e encontrei um papel amarelo amarrado a uma frondosa mangueira e flamulando doidamente num vento que só aparecia durante um mês do ano. Estava escrito isso:

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Tem gente que passa a vida fazendo perguntas em excesso. Alguém como quem vos fala que no auge dos seus 30 anos não sabe viver a vida que deveria ou simplesmente poderia viver. Alguém que no auge dos seus 30 anos ainda trava uma batalha cansativa e insistentemente inconsequente com a intangível querida vida que ninguém sabe nem o que é.

Pergunte a alguém o que é vida e  depois me conte as respostas. Talvez você e as pessoas as quais você ousou perguntar precisem de uma tarde inteira estabelecendo um diálogo hipotético ou simplesmente uma tarde em que você ouça-as falando ininterruptamente e absorto num pouquinho de cada teoria, às vezes beirando nem estar de verdade ali, involuntariamente. Uma hora Platão vai aparecer e por mais que a outra pessoa não goste, vai ficar um pouco pensativo sobre o fato de ser o primeiro a saber que as coisas questionáveis do mundo não têm resposta.

É por isso que me decido tanto a saber o que é vida; gostaria de ajudar as pessoas de alguma forma e quem sabe ajudar a mim mesmo também. Além disso, mais nunca mais fui pioneiro em nada e morreria por ser conhecido por um corte epistemológico. Não seria encantador? Ou assustador? Porque muita gente passaria a me conhecer, e não sei se suportaria. Há tanta gente no planeta e ninguém soube o que dizer. Ou talvez não tenha procurado direito.

Tenho um cavalo, uma plantação de dois hectares de avelã e uma coleção de canivetes. Mas certa vez encontrei um homem de aparência triste no caminho para a cidade que me pediu uma avelã e me disse que nada disso acalma a insegurança dentro do coração. Precisei de dois anos para entender e saber o que é preciso para ser pleno e seguro de si, e cheguei a conclusão que, na verdade, só é preciso ser você mesmo e ter a consciência de que ser você mesmo faz bem aos outros.

Aí, você que me lê - assim espero - me pergunta: “como alguém que vive a vida se perguntando chegou á conclusão de alguma coisa?”. Eu respondo: “eu apenas sinto, sou eu mesmo e não preciso provar nada pra ninguém”.

Só quero dizer que tive coragem.

Desejo-lhe coragem.

Coragem.

"Antes o sofrimento legítimo que o prazer forçado".
Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres
Clarice Lispector

segunda-feira, julho 06, 2015

AU PARADIS!
















Amo-te no silêncio.
Não no silêncio entre as coníferas de Helsinque,
ou nas montanhas do Atacama,
ou na Rua de Santa Rosa de madrugada,
tampouco neste ar nefasto e indissolúvel de domingo.
Amo-te mesmo é no silêncio entre as coisas que não precisam ser ditas
e entre as que são poluidamente faladas e não se ouve,
pois se está amando.

DIÁLOGO PÓS-MODERNO!















- Add.
  ...
- Sdd.

O mundo escorreu.

domingo, julho 05, 2015

SELEÇÃO NATURAL!


















Este corpo cansado nunca pediu por nada e mesmo assim carrega diariamente fardos de fatos velados pelo que nunca pediu e vive uma via-crucis por dia. O corpo que ama, chora, clama, deseja, envelhece, que pede mais a cada trovão que ricocheteia no coração. Este corpo que precisa aceitar todas as condições que lhe são impostas em todos os instantes dessa arbitrariedade que chamam de vida. E vida é coisa que não existe. O que existe e onde se está nesse momento, na verdade, não tem nome. Qual o propósito de estar nesse lugar em que a imprevisibilidade pode ser não existir mais no instante seguinte? Então continuo com tudo de mim e com tudo em mim. 

Desde já, desculpe. Desculpe se sou demais e lhe assusto. Desculpe se amo demais, se sou tudo demais, e deixo minhas entranhas em carne viva para quem quiser olhar e provavelmente pensar "olha, como estão avermelhadamente sentimentais!". É que sou excessivo por natureza e não nasci para ser na medida. Não nasci para amar na medida, para sofrer na medida, pensar na medida, não nasci para os limites. Ou na verdade, nasci para aos limites, porque assim como todo ser humano inconscientemente frágil e limitado todo meu excesso também chega a um nível de coragem que beira esgotar a adrenalina, mas num vulto decresce e se estabiliza, neutralizando-me, deixando-me inerme e sem reação para tudo, principalmente, para pensar. Meu suposto excesso é uma salvação ou a destruição do corpo de uma vez.  

Mas vou.
Apenas sigo no fantasia e na realidade, sendo eu.
Eu:
Um animal que segue a naturalidade do que foi destinado a ser:
.

quinta-feira, julho 02, 2015

DIÁLOGO SOBRE O AMOR!




















"Eu te amo porque te amo".
Carlos Drummond de Andrade

 Poderias formalmente dizer-me o que é o amor? É que ando tão cansado que vivo
racionalizando e buscando atalhos para achar explicação para nirvanas e chegar nos
confins da vida.Tenho uma pressa descomunal para cumprir meu papel nesse mundo.

– Por que te deixas serdes tomado por tamanha limitância que é saber do que se trata o
amor? Amor é uma coisa só e tem unidade única. Penetra por direito e não pode ser
consciente. Esquece de ti mesmo, e sente as coisas fantásticas chegarem, porque nem os
gregos saberiam o que lhe falar. Apenas sinta.